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Alfa Romeo Giulia Quadrifoglio

Alfa Romeo Giulia Quadrifoglio
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“Italian Thunder”

“Este vai ser complicado.” Foi o que eu pensei, assim que pus em cima da mesa a chave do Alfa Romeo Giulia Quadrifoglio que repousa lá fora, numa noite chuvosa, após uma volta que fez, de certa forma, criar um novo mindset sobre performances. Vai ser complicado de explicar, de exprimir por palavras o que é este automóvel, o que significa para a marca e o que se sente ao explorar tanto o seu limite, como na maior parte do tempo, o nosso próprio limite…

A Alfa Romeo tem uma história riquíssima. Fundada em 1910 e desde cedo ligada às corridas, teve um importante papel na criação da mítica Ferrari, que, para quem não sabe, só chegou 37 anos depois, em 1947. Uma das personagens que também marcou a Alfa Romeo foi Enzo Ferrari, que, de forma algo indireta, tem uma responsabilidade no segundo nome deste carro: Quadrifoglio, ou em português, um menos bonito – “Trevo de quatro folhas”.

Estávamos nos anos 20, quando Enzo Ferrari deixou de estudar para se tornar um piloto de automóveis. Durante o processo conheceu Ugo Sivocci, um igualmente apaixonado por carros que lhe conseguiu arranjar um lugar numa pequena equipa: a CMN. Enzo evoluiu e passou para a fortíssima Alfa Romeo, e aí retribuiu o favor e conseguiu incluir Sivocci nas fileiras da marca Transalpina, formando uma equipa de quatro pilotos, ao lado de Giuseppe Campari e de Alberto Ascari. Contudo, a historia de Ugo na marca não era a mais feliz, isto porque era um azarado, não conseguindo conquistar vitórias, mesmo sendo competitivo.

Foi então que, em 1923, Ugo Sivocci incluiu um losango com um trevo de quatro folhas no seu interior, de forma a que lhe desse sorte, tanto a ele como à equipa. Com esse adereço, veio finalmente a sua primeira vitória, que tanto ambicionava, a bordo de um Alfa Romeo. Mas infelizmente, nesse mesmo ano, viria a falecer num trágico acidente em testes, ao volante de uma das máquinas da equipa. Desde aí, esse losango transformou-se num triângulo, perdendo um dos lados em homenagem ao piloto Italiano.

Foi uma longa introdução, é certo, mas vai ter a sua lógica.

A verdade é que, embora a Ferrari recuse afirmar que há passagens de knowledge, o certo é que este motor é muito semelhante ao encontrado debaixo do capot do Ferrari California, ou do mais recente 488 GTB, bastando apenas tirar um par de cilindros e as semelhanças são óbvias.

Mas vamos por partes. O seu estilo é absolutamente elegante, não pode haver alguém que tenha uma boa saúde visual, que ache que este automóvel não é belo. As suas linhas bastante fluidas, mas robustas e esculturais, fazem lembrar um coupé. A longa e agressiva frente, onde se destaca o Scudetto, grelha em V que é também uma imagem de marca, completa uma dianteira que, comparada com os normais Giulia, conta com um capot redesenhado, com saídas de ar, bem como grelhas de ventilação mais generosas, assim como um “lip” dianteiro em carbono que funciona como um apêndice aerodinâmico activo, que ao se mover cria uma maior força vertical ascendente em altas velocidades.

A lateral é também ela cheia de pormenores e diferenças. O trevo chama a atenção, tal como as jantes de 19’’ e o seu enorme sistema de travagem Brembo, com discos perfurados e ventilados, com 360mm na frente e 340mm atrás, com a particularidade de, na frente, serem “mordidos” por seis êmbolos, prometendo paragens bastante eficazes. Aqui é notória também a inferior distância ao solo. A traseira é talvez a área que transpira mais desportividade neste modelo. O enorme difusor esconde as quatro saídas de escape, ao mesmo tempo que a sua função cria um “efeito solo”, e a larga traseira conta ainda com um spoiler em carbono.

O interior reflete também uma enorme dose de bom gosto, com um perfeito equilíbrio entre o dinamismo, necessário num modelo deste tipo, e o conforto, equipamento e espaço que é tão procurado num automóvel deste formato, contando com quatro confortáveis lugares e uma bagageira de 480l.

O tablier apresenta uma boa escolha de materiais, sendo bem construído, e destacando-se por ser revestido em pele, tanto na parte superior como nas portas, pormenor que dá um toque mais luxuoso a um interior que pode contar com vários pespontos à escolha, com cada Giulia Quadrifoglio a poder ter a “assinatura” do seu proprietário.

As maiores diferenças encontram-se nos bancos, com um maior apoio, quer na parte lombar, quer nas pernas, assim como o volante, com acabamentos em carbono, pele e alcântara, com uma maior espessura e boa dimensão. Conta com as patilhas de seleção da caixa ZF de 8 velocidades, montadas de forma fixa na coluna de direção, com uma construção em alumínio. Os acabamentos em carbono estão dispostos em muitas outras superfícies, nomeadamente na consola central, onde se encontra o joystick que controla todo o sistema multimédia, assim como o Alfa DNA Pro que permite ao condutor selecionar o melhor modo de condução, onde se inclui um inédito modo Race.

Para “acordar” o possante motor 2.9 V6 Biturbo, que debita 510cv, basta um toque no botão Start vermelho que está colocado à esquerda no volante. Onde é que já vimos isto? Na Ferrari, pois claro!

Começamos por arrancar no modo A: Advanced Efficiency do AlfaDNA Pro. Este modo é o mais “suave” e poupado de todos, até porque estava a chover e este era o primeiro contacto com este Quadrifoglio. Num primeiro impacto, acho que disse em voz alta:

Mas enganei-me e trouxe um Veloce?

O trajeto de 20min de volta ao escritório revelou-se calmo, uma espécie de cordeiro em pele de lobo, com uns consumos até comedidos (acho que foi a única altura que isso realmente aconteceu). Porquê?

Porque, naturalmente, o comando começou a rodar. O N: Natural, acaba por ser uma boa escolha, com uma resposta um pouco mais eficaz e rápida, com a transmissão a continuar a ser bastante suave, e com um toque mais forte de acelerador. Já se sentia algo a querer crescer…

Obviamente, e passado muito pouco tempo, já o modo D: Dynamic, acaba por deitar abaixo todas as dúvidas e distanciar-se léguas de um “simples Veloce”. A resposta é absolutamente estratosférica, o escape começa a ficar mais audível, e neste primeiro impacto, mudou a minha realidade…

Mas antes de continuar com a parte dinâmica, convém falarmos um pouco da questão técnica, onde este Alfa Romeo Giulia Quadrifoglio tem muitas novidades.

Começamos pelo Torque Vectoring, de dupla embraiagem, montada no diferencial colocado no eixo traseiro, e que distribui o binário de forma separada entre as rodas posteriores. Assim, a transmissão de binário/potência à estrada é feita de forma mais eficaz, evitando que os sistemas de controlo de estabilidade entrem ao mínimo “deslize”.

Para além do Active Aero Splitter e do DNA Pro, o Quadrifoglio é mais do que uma cara bonita, tem também um enorme “cérebro”. Ou seja, foi desenvolvido em conjunto com a Magnetti Marelli, o que faz do CDC (Chassis Domain Control) o coordenador de toda a eletrónica a bordo, gerindo da melhor maneira a ação dos diversos dispositivos, atribuindo a cada um deles uma tarefa de forma a otimizar tanto as performances como o prazer de condução. Este sistema adapta-se em tempo real à condução, com base nos dados de aceleração e rotação.

Outra novidade, é a caixa ZF, que no Giulia Quarifoglio é ainda mais rápida. Quando o modelo está colocado no modo ‘Race’, a troca de mudança ocorre em apenas 150 milissegundos, tendo igualmente o funcionamento suave que se espera desta transmissão de 8 velocidades.

De forma a terminar esta parte mais técnica, o Giulia é dos primeiros modelos do mercado a contar com um sistema eletromecânico IBS, combinando o controlo de estabilidade com o servofreio, incrementando de forma significativa a distribuição de peso, sem “beliscar” o feeling do pedal e eliminado as vibrações. Graças a este sistema, a imobilização dos 100km/h aos 0, é feita em apenas 32 metros.

Dinamicamente falando, o Giulia Quadrifoglio destaca-se desde logo pela sua direção bastante direta e informativa, que seja qual for o modo de condução escolhido, dá uma enorme confiança e segurança ao condutor, com a frente a estar sempre bem presa ao chão. A suspensão tem um papel igualmente importante, ao conseguir absorver de forma irrepreensível as irregularidades do piso, dando a informação tão necessária de ser obtida pelo condutor, que nos modos mais desportivos (Dynamic e Race) pode mesmo ser ajustada em dois níveis de amortecimento. O motor é um autêntico “pulmão de atleta”, com os seus 510cv em conjunto com os 1695kg de peso total, que dão ao Giulia Quadrifoglio uma impressionante relação peso/potência de apenas 3,3kg/cv, conseguindo por isso a proeza de “catapultar” o ponteiro dos 0 aos 100km/h em apenas 3,9s.

Mas o cronómetro não faz jus ao que se sente na prática, com a entrega de potência a ser sentida de forma possante, mas também com uma grande dose de suavidade, escalando numa toada rápida até uma velocidade de ponta acima dos 300km/h…

A sinfonia Italiana é complementada pelo tal sistema de vectorização de binário que falámos acima, e que funciona na perfeição. Mesmo provocado, o Giulia Quadrifoglio teimava em não sair da sua trajetória, tal é a aderência dada pelo sistema, mas também pelos generosos pneumáticos Michelin Pilot Super Sport 285/30 R19. Assim que esse limite é ultrapassado, é notória a perfeita distribuição de peso (50:50), que facilita as derivas, mesmo quando contamos com 600Nm de binário debaixo do pé direito.

Este motor é qualquer coisa de especial. A sua disponibilidade impressiona, tanto quanto o seu estilo “camaleónico”, que varia entre um Grande Turismo e um desportivo feroz. Explorado ao limite, brinda-nos com um som grave, suspenso apenas pelo “estalo” do combustível por explodir que fica no escape, um som viciante, que apenas termina perto das 7000rpm, altura de mudar para a relação acima, de forma super-rápida. Para um som ainda mais audível, o modo Race é um perfeito hooligan que nos deixa por “nossa conta e risco”, ao desligar totalmente o ESP, ao mesmo tempo que apresenta no ecrã central o shifter light de modo a tornar cada passagem de caixa perfeita. Neste modo, é onde se pode tirar todo o partido deste desportivo.

A ligeireza em curva impressiona, fazendo esquecer que este é um automóvel com 4,64m. A berlina sai de curva em busca de outra sem qualquer tipo de perda de potência, com uns travões fáceis de dosear, bastante potentes e que podem ser abusados. Mesmo após algum esforço extra, não mostraram quaisquer sinais de fatiga, mas ainda assim, a Alfa Romeo propõe em opção o sistema de travagem em Carbo-Cerâmica, por sete mil euros.

Já que falamos em euros, o Alfa Romeo Giulia Quadrifoglio começa nos 96.500€, para a versão equipada com a transmissão manual. Mas não faça isso! Os 2300€ a mais pela caixa automática da ZF fazem tirar um melhor partido deste automóvel, que somando os opcionais presentes nesta unidade, ascendem a pouco mais de cem mil euros. Um valor bastante justo face aos seus rivais, bem mais dispendiosos e que contam com uma menor potência. Os consumos? Não ficaram nos “imaginários” 8,2l/100km que a marca anuncia, ainda que isso (sim, experimentámos) seja possível num andamento muitíssimo calmo. No final, o computador marcava 13,3l/100km. Poderia ser bem pior…

A Alfa Romeo demorou até lançar algo deste género, um automóvel que pudesse realmente rivalizar com os desportivos alemães. O Giulia Quadrifoglio acaba por ser como o que lhe dá o nome, um trevo de quatro folhas: a possibilidade de encontrar um é de 1 em 10 mil, mas a Alfa conseguiu e deu a conhecer um automóvel apaixonante, bastante eficaz e muito, mas muito rápido.

É, sem duvida, um dos melhores automóveis à venda atualmente.

Alfa Romeo Giulia Quadrifoglio 510 AT8

Especificações:
Potência – 510cv às 6500rpm
Binário – 600Nm às 2500rpm
Consumo Combinado Anunciado – 8,5L/100km
Consumo Combinado Medido – 13,3L/100km
Aceleração 0-100km/h (oficial): 3,9s
Velocidade máxima (oficial): 307km/h

Preços:
Alfa Romeo Giulia Quadrifoglio desde: 96.500€
Preço da versão ensaiada: 98.800€
Preço da versão ensaiada c/opcionais: 105.580€

Fotos: Rodrigo Inocêncio

Rodrigo Hernandez Fundador e Director Editorial, criou o MotorO2 em 2012 devido a uma tremenda vontade de escrever acerca da sua grande paixão: os automóveis! Paixão essa que existe mesmo antes de falar, já que a sua primeira palavra foi a de uma conhecida marca de automóveis. Sim, a sério!